A ASCENSÃO
DE MANOEL VARELLA DO NASCIMENTO
Texto de
André Felipe Pignataro Furtado de Mendonça e Menezes
Sócio do
IHGRN
A mística
que envolve Manoel Varella do Nascimento, o Barão de Ceará-Mirim, é
extraordinária. Seu nome persiste ao tempo e ainda ecoa por toda a cidade, e,
também, pode-se dizer, por todo o Rio Grande do Norte. É, pois, atemporal. O
Barão é como uma grife. E, por isso, é orgulho para Ceará-Mirim.
Câmara
Cascudo, Nilo Pereira e Olavo de Medeiros Filho são leituras obrigatórias para
conhecer a história do Barão. Dos referidos autores, sabe-se que Manoel Varella
do Nascimento nasceu em 24.12.1803, em Ceará-Mirim, no sítio Veríssimo,
localizado nas proximidades do Engenho São Francisco (atual usina), sede
perpétua do seu baronato. Era filho de José Felix da Silva e Anna Teixeira
Varella. Casou-se no dia 09.10.1839 com Bernarda Dantas da Silva, filha de
Francisco Teixeira de Araújo e Izabel Dantas Xavier, no engenho Capella, também
em Ceará-Mirim, de propriedade do pai da noiva. Em 08.07.1874, foi agraciado
com o título nobiliárquico que o tornou célebre. Morreu em casa, em 01.03.1881,
aos 77 anos.
Pouco se
sabe sobre a primeira metade de sua vida e como fez fortuna. Magdalena Antunes,
em sua obra Oiteiro: Memórias de uma Sinhá Moça, nos dá uma boa referência da
visão de Manoel Varella para os negócios, ao narrar o episódio da compra da
propriedade Ilha Bela a alguns caboclos, de modo a evidenciar o seu tino de
empreendedor.
Cascudo, na
Acta Diurna “O Barão do Ceará-Mirim”, de 03.01.1943 (A República), afirma que
Varella começou como pequeno plantador e seu engenho era equipado com moendas
de cilindro vertical. Posteriormente, trouxe cilindros horizontais de Recife e
divulgou a cana caiana (cayenne). Mas não se sabe em qual período isso ocorreu.
Na mesma
Acta, Cascudo informa que, em 24.04.1828, Varella, com apenas 24 anos, foi
nomeado alferes por D. Pedro I. Parece-nos que é neste momento que começa a
ascensão do futuro Barão. No ano seguinte, ele, alferes, foi eleito presidente
da Câmara de Extremoz, para a legislatura de 1829-1832. Não é demais lembrar
que Ceará-Mirim, antes chamada de Boca da Mata, estava inserida no território
municipal de Extremoz. Apenas em 1858 é que houve a transferência da sede
municipal para Ceará-Mirim, que foi elevada à condição de vila, ao mesmo tempo
que Extremoz foi rebaixada à condição de povoado. Presidiu a Câmara, novamente,
em 1837-1840. Em 1839, aos 35 anos, militar e liderança política local,
casou-se com uma filha de senhor de engenho.
Pois bem.
No último ano de Varella como presidente da Câmara de Extremoz, o imperador D.
Pedro II alcançou a maioridade, pondo fim ao período regencial. A Câmara,
então, seguindo os costumes da época, enviou o seguinte telegrama de
felicitações, o qual foi publicado no jornal Correio Official, do Rio de
Janeiro, de 09.10.1840:
“Ilm. e
Exm. Sr. – A Câmara Municipal da Vila de Extremoz, província do Rio Grande do
Norte, exultou de jubilo e concebeu as mais bem fundadas esperanças por ter S.
M., o senhor D. Pedro II, assumido, no dia 23 de julho de 1840, a plenitude dos
poderes, que, pela Constituição do Estado, lhe competem. O Brasil, de novo,
encadeará na senda da brilhante carreira que lhe está designada pela
providência.
Felizmente,
este acontecimento veio dissipar o medonho aspecto dos males que estavam
iminentes. Graças à divina providência, já nos é dado antolhar o nosso
horizonte político desassombrado de tais névoas. Já contamos com mais garantias
para a estabilidade de nossa santa religião, para a monarquia constitucional,
finalmente para união e integridade do Império brasileiro.
Esta
Câmara, Exm. Sr., penetrada de tais sentimentos, que qualifica como
verdadeiramente patrióticos, depois de congratular-se com V. Ex. por tão fausto
acontecimento, se apressa a manifestar por este meio, rogando à V. Ex., queira
fazê-los presentes ao nosso Imperador e ao Ministério e fazer-lhes sentir que
esta Câmara tem, por norte, a lei, distintivo à honra.
Deus guarde
a V. Ex. Paço da Câmara Municipal da Vila de Extremoz, em sessão extraordinária
de 19 de agosto de 1849.
– Ilm. e
Exm. Sr. Ministro e Secretário de Estado dos Negócios do Império Antonio Carlos
Ribeiro de Andrada Machado e Silva.
– Manoel
Varella do Nascimento – Francisco da Rocha Bezerra Junior – Felippe Varella S.
Thiago – Francisco de Paula Paiva – Francisco Bernardo de Gouvêa – Francisco de
Paula Soares da Câmara – Francisco de Sousa Xavier”.
Outra
importante informação acerca de como Varella ascendeu economicamente vem da
publicação de um relatório assinado por João Carlos Wanderley, contendo as
descrições pormenorizadas dos rios Ceará-Mirim e Maxaranguape, e de suas
respectivas ribeiras, no jornal Correio Mercantil, do Rio de Janeiro, de
28.09.1848. Wanderley, que chegou a ser presidente da Província do Rio Grande
do Norte, era, à época do citado relatório, secretário da presidência da
província.
Entre
tantos dados referentes aos mencionados rios, o relatório incluía os nomes e as
qualificações dos donatários, as propriedades e as distâncias delas até a
barra, com a identificação se na margem norte ou na margem sul.
O nome de
Manoel Varella do Nascimento, qualificado como alferes e agricultor, aparece
como donatário do sítio São Francisco, no lugar Jaçanã, distante cinco léguas e
meia da barra do rio Ceará-Mirim, na sua margem sul. Ao ler os nomes dos demais
donatários, é possível identificar, além do seu sogro Francisco Teixeira de
Araújo (Capella), vários outros companheiros de Varella na Câmara de Extremoz,
que assinaram o telegrama ao novo imperador, como Felippe Varella Santiago,
padrinho de casamento do futuro Barão (Capoeira Grande), Francisco Bernardo de
Gouvêa (Camurupim), Francisco de Paula (Boca da Ilha) e o tenente Francisco de
Sousa Xavier, meu pentavô, além de outros nomes bastante conhecidos.
Sendo
assim, pode-se ousar concluir que o futuro Barão do Ceará-Mirim, em que pese
ter seus méritos na construção da sua fortuna, contou com a benevolência da
Coroa – assim como ocorreu com outros grandes nomes de sua época, e em todas as
Províncias do Império) –, que lhe doou o sítio a que veio chamar de São
Francisco, em homenagem ao padroeiro da simplicidade e da humildade.